quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Quando o sol bater na janela do meu quarto

Nesse final de semana completaram-se 2 meses que mudei de volta para Divinópolis-MG, minha cidade natal. E respondendo à uma pergunta de um tio, percebi como está acontecendo esse processo de readaptação – e como o primeiro livro que terminei de ler depois da mudança tem a ver com isso.

Eu não me lembro exatamente quando foi que comprei “O Sol é Para Todos”, de Harper Lee, mas com certeza foi ano passado, quando lançou seu segundo romance, “Vá, coloque um vigia”. Acredito que ao ler as críticas, que mencionam o segundo romance como continuidade do primeiro, meu pensamento lógico resolveu: “vamos começar do começo”. E mesmo tendo sido adaptado para o cinema com muito sucesso, decidi que era melhor ler o livro antes de assistir o filme ganhador de 3 Oscars em 1963.

E foi com “O Sol é para todos” na mochila que viajei entre Divinópolis – Belo Horizonte – São Paulo no mês de Agosto. O livro me fez companhia e me ajudou a entender como mudanças acontecem sem que a gente perceba, especialmente aos olhos de uma criança. Não é o primeiro livro cuja história é narrada do ponto de vista infantil, e supostamente autobiográfico. Comecei a pensar se esse não seria um gênero da literatura norte-americana, junto com “O Apanhador no Campo de Centeio”, mas sendo universal como a literatura, percebi que existem obras assim também no Brasil: O Ateneu e Minha Vida de Menina, por exemplo.

Sou curiosa sobre esse “gênero literário” há muito tempo. Alguns apontam a narrativa em primeira pessoa como falha – crianças ou adolescentes não conseguiriam escrever de forma tão elaborada. Outros, para o traço autobiográfico (às vezes claro, às vezes não) como defeito que personaliza demais o livro. Acho que mesmo com as críticas, são histórias que se fossem contadas de outra forma, perderiam sua essência: relatar as mudanças de uma fase da vida. E depois de lê-los, a gente percebe que essas mudanças realmente nunca terminam.

“O Sol é para todos” é descrito na orelha do livro como “uma história atemporal sobre tolerância, perda da inocência e conceito de justiça”. Mas tolerância, inocência e justiça não são conceitos infantis. Eles nos acompanham a vida toda, e vão sendo alterados a partir de nossas experiências. Quando meu tio me perguntou como estava sendo a adaptação SP-Divinópolis, ele me lembrou o quanto eu mudei no período em que estive fora. Algumas pessoas sugeriram que eu sentiria falta do ritmo de São Paulo, das muitas opções pra tudo, enfim, das comodidades de uma cidade grande. Para minha surpresa, descobri que consigo ser mais tolerante aos “defeitos” de uma cidade do interior, e que perdi a minha inocência de adolescente, como era de se esperar depois de tantos anos.


Mas morar em São Paulo modificou completamente o meu conceito de justiça. Fez com que o certo e o errado ficassem cada vez mais claros, preto no branco, à medida que eu percebia o cinza da metrópole. E seria injusto dizer que só eu mudei nesse período. A cidade para qual voltei também não é mais a mesma – Graças a Deus! A literatura mostra que nem sempre as mudanças são percebidas, e a experiência nos diz que algumas não são bem vindas. Só que mudar é preciso, e por mais que seja clichê, a vida acontece é no fluxo. O legal é que ficam as histórias, que contam como nossos conceitos vão se alterando ao longo do tempo.

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